É domingo. Dia da mãe (adoro-te muito mãe, mesmo com as nossas turras tão peculiares, o nosso amor é infinito), dia da benção das pastas, dia de celebrar, dia de derrota para o benfica. É dia de tanta coisa com ou sem valor, e é também dia de vazio.
Tenho a mala feita ("... o que importa é partir, não é chegar"), estou recostada na cadeira, no porto de abrigo. Não posso dizer que tenho, neste momento, um diferendo com a minha vida.
E, contudo, estou tão mal por dentro. Porque não vivo só para mim. Porque sei que, aqui bem perto, alguém que eu adoro tanto, está tão mal. E, acima de tudo, por me sentir tão impotente.
Não sou capitã deste mundo; não rejo destinos, não posso dar ordens à tripulação. Não posso, a bem dizer, fazer nada.
Aonde está a minha fé?
Na vela que teimo em manter acesa e ténue?
Em mim, incrédula e sem superpoderes?
Qual é o limite da minha fé?
Dou por mim a por em causa... Não gosto. Acreditar trouxe-me até aqui. Trouxe-me ao que sou. Ao muito ou pouco que consegui. Esta tremenda incapacidade de acreditar, depois de ouvir o choro abafado e gritante... Esta dor, ao sentir aquela dor. Este desespero mudo sem poder arrancar o chão ao mundo. Sem poder fazer do mundo o que precisava que ele fosse.
Este fim que nunca teve sequer um começo... O que é a vida? O que é este conjunto de dilemas? O quê??? E parece que não sei nada. As estradas intersectam-se sem terem caminhos comuns. "Para que nada mude, é preciso que tudo mude..." "Para que nada mude, é preciso que tudo mude..." "Para que nada mude, é preciso que tudo mude..." "Para que nada mude, é preciso que tudo mude..." "Para que nada mude, é preciso que tudo mude..." Mudar o quê? O que não pode ser mudado? Como é que te posso deixar para trás?.. Como?
Mais um xuto de fé... Mais um calcanhar dorido... Mais um dia... E outro. Ainda outro.
Mais alguns.
Até que a dor te passe. Até que a dor te adormeça e te faça sentir que tudo não passou de um sonho mau.
Até que acordes de novo e consigas ver que ainda há muito caminho pela frente.
E, nessa altura, talvez eu te possa ajudar.
Estou aqui. Aparentemente serena e em turbilhão por dentro. A pensar onde andarás agora. Se precisas ou não que vá já ter contigo. E o teu silêncio não me subtrai a angústia. O teu silêncio é o meu medo.
Ver pessoas no Lido (Madeira), neste exacto e preciso momento, em plena catástrofe, jantarem felizes e contentes num dos restaurantes mais fantásticos lá do Burgo, enquanto centenas de pessoas, a uns metritos dali, ficaram sem tecto e estão, neste mesmo momento, de estômago vazio...
Seremos assim tão desumanos?